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quarta-feira, 24 de outubro de 2012

A Política - Aristóteles [arte 18 b]

O Regime Moderado
Pelo contrário, a justa moderação é reunir às instituições da oligarquia as da
democracia, propondo um salário a uns e impondo uma pena aos outros.
Mediante isso, o governo, ao invés de estar nas mãos de apenas uma parte,
será comum a todos. De resto, não devem ser admitidos senão os que portam
armas.
O censo não pode determinar-se pura e simplesmente. É preciso, porém,
que o seja com a máxima amplitude possível, para que os participantes sejam
mais numerosos do que os não-participantes. Quanto aos pobres, eles se
consolam por não participarem e ficam descansados se não os ultrajam e lhes
deixam os poucos bens que possuem, o que nem sempre acontece, pois os
indivíduos de condição que pretendem os cargos públicos às vezes não são
nem corteses, nem humanos. Resulta daí que, se houver guerra, os pobres a
evitam, a menos que os sustentem. Mas se os sustentarem, passam a desejá-la.
Em alguns lugares, o governo é formado não apenas por aqueles que
portam armas, mas pelos que as portavam. Os malianos escolhiam seu
Conselho dentre estes, e seus magistrados dentre os guerreiros em atividade. O
primeiro Estado entre os gregos foi organizado com esta espécie de cidadãos,
depois da extinção das monarquias; e em primeiro lugar com cavaleiros, pois a
força e a Superioridade dos exércitos consistiam então na cavalaria. Pois as
outras tropas de nada servem se não tiverem disciplina, e antigamente não
havia nem disciplina, nem experiência na infantaria, de sorte que a cavalaria
sozinha constituía toda a força do Estado.
Mas como os Estados cresceram e ganharam consideração através das
outras armas, o governo foi comunicado a um maior número de pessoas. Assim,
o que hoje chamamos de República era então chamado de democracia.
No que se refere aos antigos Estados, eram todos, segundo sua aparência,
oligárquicos ou monárquicos. Com tão pouca gente, não se podiam encontrar
muitas pessoas abastadas, de modo que o povo, pouco numeroso e quase sem
distinção de categorias, se deixava facilmente governar.
Eis o que tinha a dizer sobre as causas dessa diversidade de Estados, bem
maior do que a enumeração que se tinha feito até agora (pois há bem mais de
uma espécie de democracia e mais de um tipo nos outros gêneros)". Vemos
agora suas diferenças e de onde procedem, seu nível, sua preeminência e sua
conveniência mais para tal povo do que para tal outro.

Da Subversão e das Conservação
dos Governos

Discutimos quase todas as questões de que devíamos tratar. Para terminar,
é normal examinar de onde vêm as revoluções dos Estados, quantas causas
podem provocálas e quais são elas, a que depravações cada governo em
particular está sujeito e quais são os meios de preservação, os remédios gerais
e específicos para essas perturbações.
Em primeiro lugar, deve-se estabelecer como princípio que, nas diversas
formas de sociedade que foram adotadas, geralmente houve um acordo para
manter o direito e garantir a igualdade proporcional. Muitos, porém,
compreenderam-no mal. A democracia, por exemplo, decorre de que, sendo
todos iguais sob alguns aspectos, se consideraram absolutamente iguais, e de
que, sendo todos livres de modo semelhante, imaginaram ser absolutamente
semelhantes. A oligarquia, pelo contrário, decorre de que, sendo certas pessoas
desiguais em algumas coisas, por exemplo, em riqueza, se acreditaram
superiores em tudo. Donde se segue que alguns, como iguais, se crêem dignos
de participar igualmente de tudo e outros, como desiguais, querem ter mais em
tudo, pois mais é uma desigualdade. Uns e outros têm certa aparência de razão,
mas se enganam, tomando por absolutamente justo o que o é apenas em parte.
A conseqüência disso é que, quando não conseguem a parte que crêem
ser-lhes devida no governo, provocam as sedições.
Se houvesse uma causa justa para elas seria a excelência do mérito, pois
esta é a única superioridade absoluta. Todavia, os homens que menos
provocam revoltas são os que se sobressaem quanto ao mérito. Mas outros há
que têm pretensões por causa do nascimento, como os nobres a que os avós
transmitiram brilho e riqueza. Toleram com grande impaciência a igualdade e
sua arrogância é fonte ordinária das agitações.
Os Estados mudam de duas maneiras. Às vezes passam de uma forma a
outra, como da oligarquia para a democracia, para a República ou para a
aristocracia, ou ainda desta para aquela; às vezes, sem mudar de forma nem de
Constituição, mas conservando-as, substituem-se os chefes e os senhores,
como quando se usurpa o trono numa t monarquia ou se forma um novo senado
nas oligarquias.

Permanência do Estado Através dos Regimes
Uma questão prévia consiste em saber se, depois de uma revolução tal
como a de que trataremos, a Cidade permaneceu a mesma ou se se tornou
outra. Devemos preocupar-nos tanto com o lugar quanto com as pessoas. É
possível que ocorra um desmembramento no território ou uma separação entre
as pessoas, continuando algumas a, morar no mesmo lugar e outras partindo
para outro. 
De resto, basta simplificar a questão. Pois, tendo a palavra Cidade vários
sentidos, a solução será mais fácil com a distinção.
Do fato de as pessoas habitarem o mesmo lugar não se segue que se trata
de uma única e mesma Cidade. Os muros não podem servir de critério, pois
todo o Peloponeso poderia ser cercado por uma mesma muralha. Não seria a
primeira vez que vastos espaços seriam assim fechados. Assim são todas as
grandes cidades, que se parecem menos com cidades do que com uma nação
inteira, como Babilônia. Três dias já se haviam passado, dizem, desde que fora
tomada e em vários bairros ainda de nada se sabia.
Essa extensão dos Estados e das cidades foi tratada alhures, pois também
cabe à política determiná-la.
São também questões de política saber se convém que um Estado só
contenha uma nação ou várias, se continua a ser o mesmo enquanto conserva o
mesmo gênero de habitantes, apesar da morte de uns e do nascimento de
outros, como os rios e as fontes, cuja água corre sem cessar para dar lugar à
água que sucede.
Também é política, enfim, a questão de saber se, continuando a ser as
mesmas as pessoas, a Cidade pode mudar. A Cidade é um tipo de
comunidade; é a universalidade dos cidadãos. Portanto, se a qualidade de
cidadão variar conforme a forma de governo, não será mais o mesmo Estado
quando o governo passar de uma forma a outra, assim como, permanecendo os
mesmos atores, o coro não deixa de mudar quando passa do cômico ao trágico.
O mesmo ocorre com todo outro composto ou agregado cuja forma varia.
Permanecendo as mesmas vozes e os mesmos instrumentos, o canto não é
mais o mesmo quando passa do modo dórico ao modo frígio. Isto posto, é a
forma e não a matéria que decide se um Estado permanece o mesmo e se se
deve, apesar da identidade de habitantes, chamá-lo de outro nome ou
conservar-lhe o nome, embora seus habitantes tenham mudado. Restaria ainda
saber se a modificação de forma o dispensaria de manter seus compromissos.

O Excesso de Desigualdade, Causa
Principal das Subversões

As transformações fazem-se do mais para o menos ou do menos para o
mais, isto é, aumentando ou diminuindo a intensidade da oligarquia ou da
democracia, ou ainda dos outros governos, de modo que o Estado se torne
mais ou menos oligárquico, mais ou menos democrático e assim por diante.
Modifica-se ainda certa parte do sistema político, quer inaugurando, quer
suprimindo alguma magistratura, como dizem que na Lacedemônia Lisandro
tentou abolir a monarquia e Pausânias a eforia. Foi também assim que em
Epidamno, em lugar dos Filarcas, se criou um Senado, e na democracia de
Atenas se manteve, no tribunal dos Heliastas, o costume de preencher os cargos
vacantes com pessoas que tivessem estado em outros cargos; o arcontado, que
é a primeira dignidade neste Estado, é outro resíduo da antiga oligarquia.

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