Total de visualizações de página

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Engenho da minha infância - Aluna: Mariana Pedrosa Alves

Recordo muitos casos, dos tempos da minha infância, do engenho de cana-de-açúcar que
havia aqui no Sítio Bonfim dos Pedrosas, uma pequena comunidade onde moro, a 2 quilômetros
da cidade de Carrapateira, no alto sertão da Paraíba. Lembro-me muito bem do período
das moagens, era uma verdadeira festa, a que vinham muitos habitantes das cidades vizinhas
e até mesmo de outros Estados, como Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte.
O engenho, que foi fundado em 1935, tinha grandes moendas de ferro puxadas por
boi, energia elétrica não havia por aqui, vivíamos no escuro, à luz de lampiões e candeeiros,
mas isso não importava. Em noites de moagens os trabalhadores se reuniam no galpão do
engenho e enquanto o mel engrossava para dar o ponto da rapadura contavam histórias,
anedotas e até contos de assombração. Eu adorava ouvir essas conversas, esperando o
momento do ponto da rapadura nas gamelas sair – repartimentos onde colocavam o mel
em ponto de rapadura: era o momento mais esperado por todos nós para comermos a rapa
quentinha da rapadura que sobrava nas gamelas.
Todos os anos, a partir do mês de agosto até meados de novembro, realizavam-se as
moagens durante várias semanas. Eram tempos de muito trabalho, mas também de festa e
alegria. Em noite de lua cheia meus amigos e eu brincávamos na bagaceira da cana, que
mais parecia um escorregador, no qual rolávamos de cima a baixo, num sobe e desce de
fazer gosto! Pela madrugada, meu pai me acordava, era hora de carregar os jumentos com
a cana, que era levada do sítio para o engenho para alimentar os bois que puxavam a
moenda. Eram tempos difíceis, de trabalho árduo, mas os donos do engenho e os produtores
ficavam satisfeitos, pois gerava renda e emprego para muita gente. A rapadura era o
produto mais famoso do engenho, que ainda hoje guardo na memória o cheiro e o doce que
não encontro nas rapaduras de hoje.

O velho engenho cansou, funcionou pela última vez em 1976, ficamos tristes, o silêncio
no nosso vilarejo fazia doer, tentamos reerguê-lo, mas o esforço foi em vão. Em outros centros
a produção era mais rápida e com baixo custo, enquanto o nosso trabalho era quase
artesanal e a precariedade já estava sendo vista a olho nu.
O engenho deixou também um rastro de tragédia e desespero: a filha de um dos donos
do engenho caiu dentro de um cavudo – buraco onde jogavam as brasas do engenho –, a
menina gritava, chorava e não conseguia sair, seu corpo derretia nas brasas como plástico
velho em chamas. Revivo esse momento como se fosse agora, choro e me arrepio de emoção.
A menina sobreviveu, ficou com um dos braços paralisado e marcas e cicatrizes em
todo o corpo, mas ela foi forte, lutou e venceu.
Ainda hoje sento-me debaixo de um juazeiro e, olhando o lugar em que era o engenho,
me vem a lembrança daqueles momentos. Hoje sou agricultor e aqueles tempos que pareciam
mais como festa de criança ficarão para sempre guardados em minha memória.

(Texto baseado na entrevista feita com o sr. Antônio Pedrosa da Silva, 64 anos.)

Professora: Valma Laene Pedrosa Roberto
Escola: E. M. E. F. Galdino Antônio da Silva • Cidade: Carrapateira – PB

Nenhum comentário: