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sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Do canto ao conto - Aluno: Jerônimo Pereira de Lima

Quando escolhi o poeta Xexéu para falar de suas lembranças, imaginei um arsenal de
memórias se transformando em versos. Acolhi-o sob sua relíquia: a mangueira-rosa.
Nasci no Sítio Lages, um lugarejo do município de Santo Antônio, no Rio Grande do
Norte, há setenta e dois anos. Olhando para a mangueira-rosa retorno ao passado. Fui
criado à sombra desse legado que minha mãe plantou. E, por falar nisso, aprendi a declamar
fazendo versos sob essa frondosa árvore. Eu declamava e cantava muito! Por essa razão
puseram meu apelido de Xexéu – passarinho cantador aqui da região.
Desde criança fui apaixonado pela literatura popular. A paixão pelas letras se concretizou
quando comprei uma cartilha do ABC. Encontrar alguém no caminho que soubesse ler
era motivo para uma explicação. Foi assim que aprendi a ler. No meu tempo era muito difícil
o acesso à escola. Atualmente, há mais escolas e até transporte escolar! Se eu fosse
desta geração, seria um doutor.
As cantorias de viola fizeram parte do meu conhecimento sociocultural, desde a minha
infância. Sinto saudades do tempo que papai me levava às feiras livres. Íamos a pé ou a
cavalo porque naquele tempo os meios de transporte motorizados ainda não haviam penetrado.
Quando eu via um autor ou vendedor de folhetos cantando versos, eu achava muito bonito e queria ser também um protagonista daqueles. As bancas armadas disputavam
espaço com as cores e os cheiros das frutas e tecidos, nos sábados de nossa cidade. Os
cantadores eram os artistas conhecidos de uma época que não conhecia o rádio nem a televisão.
Agora, o rádio faz chegar a voz dos violeiros através da Rádio Agreste AM, sediada
em nosso município.
Tudo funcionava na Rua Dr. Pedro Velho. O prédio da prefeitura ficava defronte à igreja
e era denominado “Intendência”. Hoje a paisagem é uma bela praça que descreve a religiosidade
de um povo através da imagem de Nossa Senhora da Conceição, a padroeira da cidade.
Essa rua transformou-se na famosa Avenida Lindolfo Gomes Vidal, onde o cheiro do
asfalto misturado à poluição sonora marca a evolução deste lugar.
Naquela época, encontros entre vizinhos eram também motivos de lazer. O feijão armazenado
em casa era “debulhado” após um período de safra. Era um momento atrativo para
ouvirmos histórias de “Trancoso”: contos populares. O que mais me assustava era o lobisomem
e o papa-figo! De vez em quando degustávamos café com tapioca... Hum! As noites
de muito trabalho eram chamadas de “debuiá”.
Você sabe o que é isso?
Era debulhar feijão a noite toda.
Já se foi o tempo em que a literatura oral marcava presença nos lares do nosso município.
Agora é a tecnologia que fala mais alto: os jogos eletrônicos impedem por aqui uma
tradição deixada pelos nossos antepassados. Resta-me concluir que este receptáculo de
memória representa para os leitores um presente eterno.
Vivenciei as memórias de João Gomes Sobrinho (Xexéu), passeando no túnel do tempo
as emoções próprias de sua época.

(Texto baseado na entrevista feita com o sr. João Gomes Sobrinho, Xexéu, 72 anos.)
Professora: Mércia Fontoura
Escola: E. M. Dr. Hélio Barbosa de Oliveira • Cidade: Santo Antônio – RN

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