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sexta-feira, 10 de agosto de 2012

As águas do rio Sirigi - Aluno: Elias Antônio da Silva Filho

No maravilhoso e tranquilo Engenho Pirauá passei grande parte de minha vida. Recordo-
me de que jogávamos bola às margens do enorme rio Sirigi que corta a cidade de Aliança.
Esse rio foi muito importante em minha vida, pois era a nossa principal fonte de diversão
e renda. Era sua vida que mantinha a nossa vida. Sobrevivíamos tirando as areias que nele
repousavam e vendíamos aqui em Aliança e depois do trabalho descansávamos em suas
águas claras e fresquinhas.
Oh, saudoso rio Sirigi, tuas águas alimentaram meus sonhos e minha realidade!
Hoje fico triste ao olhá-lo: suas águas estão escassas e poluídas. E as pessoas não mais
o têm como tesouro.
Lembro-me ainda claramente de mamãe atravessando o rio para me levar à escola, que
por sinal era bastante modesta. Ao se despedir, ela sempre dizia: “Boa aula, meu filho! Sei
que você é muito inteligente e vai me dar muito orgulho!” Mas eu não era exatamente assim.
Aquilo de que mais gostava era da hora da merenda. Depois, pulava o muro da escola,
voltava às refrescantes águas do Sirigi. Lá, eu ficava tomando banho até dar a hora de ir
para casa. E a sensação que tinha naqueles momentos era que estava em um sonho do qual
jamais queria acordar. Hoje me arrependo daquelas fugas da escola!
Ao voltar para a minha humilde casa de taipa – feita de madeira e barro – caminhava
direto para o pé de manga e me lambuzava naquela fruta deliciosa. Demorava-me horas
entre as folhas daquela mangueira. Esquecia-me de tudo: do trabalho pesado, da escola e
de todos os momentos de sofrimento. Sentia-me como um passarinho repousando no ninho
e só despertava ao escutar a doce voz de minha mãe chamando para jantar.
Recordo-me da alegria das festas de São João. Esperava por elas o ano inteiro. Nesses
dias, acordávamos cedinho para colher milho no quintal e ajudar na produção das comidas.
Lembro-me de que quando mamãe desviava o olhar colocávamos o dedo na panela para
provar aquelas delícias. Adorava ajudar a fazer pamonhas e canjicas... Acho até que isso me fez trabalhar vendendo aquelas delícias de minha infância (hoje faço comidas típicas de
milho para vender). À noite, nos arrumávamos para o forró: as meninas, todas de tranças,
parecendo bonecas de milho; nós, homens, fazíamos bigodes com pedras de carvão para
impressionar os brotinhos. A sanfona e a zabumba começavam a tocar e o coração da gente
disparava, pois chegava a hora da paquera. Ao som alegre da sanfona, dançávamos bem
agarradinhos e confessávamos ao pé do ouvido os segredos mais íntimos. A noite ia embora
e o forró continuava até os raios do sol aparecerem. Que saudades daquele tempo!
Ainda me lembro de que um dia, eu menino já grande, enquanto caminhava pelas
imensas terras do engenho, achei uma passagem de trem. Nem acreditei. Era felicidade
demais! Pois o sonho de todo menino de engenho era viajar naquela máquina puxada
pela maria-fumaça. Não disse a ninguém o meu achado. Naquela noite nem dormi, de
tanta ansiedade. No outro dia, cedinho, acordei e fui para a estação esperar o trem.
Quando o avistei de longe, meu coração disparou e bateu tão alto quanto o apito que saía
dele. Entrei, sentei e o sonho começou...
O deslizar suave pelos trilhos me proporcionou uma sensação que jamais esqueci: o
vento batia em meu rosto, acompanhado de uma visão maravilhosa. Passavam por mim
casas, animais, árvores, pessoas... Para onde me levaria não perguntei, não queria saber.
Estava fora de mim. Porém, algo me trouxe de volta à realidade: avistei meu rio Sirigi,
distante de mim. Naquele momento surgiu um grande medo e comecei a chorar. Queria
voltar para o meu rio, porque ele era a minha vida.
Rio e trem são lembranças que jamais sairão de minha memória.

(Texto baseado na entrevista feita com o sr. Luiz Fábio Barbosa da Silva, 48 anos.)

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