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domingo, 28 de outubro de 2012

A Política - Aristóteles [parte 22]

A atenção não deve ser menos vigilante contra as armadilhas que se armam
contra o povo. Este, de ordinário, é enganado pelos ricos em cinco ocasiões,
que são as Assembléias, as magistraturas, os julgamentos, o armamento e os
exercícios.
1°- as Assembléias: permissão a todos para assistir a elas, mas pena
contra os ricos se não assistirem a elas, e somente contra eles, ou então uma
pena maior do que para os outros;
2°- as magistraturas: proibição aos que têm rendas de recusá-las, mas que
os pobres o possam;
3°- os julgamentos: pena para os ricos que se recusarem a ser juízes;
impunidade para os pobres, ou pena maior para os primeiros, menor para os
segundos, como na lei de Carondas. (Em alguns lugares, todos os que estão
inscritos no alistamento civil podem assistir às Assembléias e ser juízes, mas há
pesadas multas contra os que, estando inscritos, não comparecerem ou não
julgarem, a fim de que a pena evite que se inscrevam e, não estando inscritos,
sejam dispensados de comparecer ou de julgar.);
4° as armas: mesma norma sobre as armas e os exercícios; permissão aos
pobres de não terem armas e pena contra os ricos se não se tiverem
preocupado em adquiri-Ias;
5°- os exercícios: nenhuma pena contra os pobres, se não comparecerem, e
pena contra os ricos, se faltarem. Assim, uns participam para evitar a pena,
outros não comparecem, não tendo nada a temer.
Nas democracias, os legisladores usam de sutilezas opostas. Propõem um
salário aos pobres que assistirem às Assembléias ou que tiverem o ofício de
juiz, e não impõem nenhuma pena aos ricos que se abstiverem.
Todas essas astúcias são funestas às Repúblicas.
Outras Práticas Salutares
Cumpre observar que existem aristocracias e oligarquias que se sustentam
menos pelo valor de sua constituição do que pela direção dos que as governam.
Uma atitude sábia e moderada tanto para com os outros funcionários públicos
quanto para com os simples particulares consiste primeiro em não fazer nem
injúria nem injustiça a estes últimos, e depois em deixar que os primeiros entrem
por sua vez na administração dos negócios, se forem capazes, não privando
nem de honras os ambiciosos, nem de lucros a multidão, e vivendo
popularmente com seus colegas. Pois a igualdade que os homens populares
ostentam para o povo não é justa apenas no Estado democrático, mas sim em
toda parte, entre semelhantes, e importa a eles observá-la. Se, portanto, há
vários oligarcas à frente do governo, farão bem em pôr em prática uma boa
parte das instituições democráticas, como a renovação semestral das
magistraturas, a fim de que todos os seus semelhantes possam obtê-las
alternadamente. Com efeito, os iguais formam, por assim dizer, um povo entre
eles. Assim, com bastante freqüência, como dissemos acima, têm os seus
demagogos. Aliás, para as oligarquias e as democracias, este é o meio de não
caírem no despotismo; pois não é tão fácil maquinar uma intriga quando se tem
pouco tempo para permanecer no cargo quanto quando nele se demora por
muito tempo. Essa longa duração, precisamente, é o que gera a tirania nas
oligarquias e nas democracias. Umas e outras tornam-se presas dos grandes. 
Nestas, os demagogos, naquelas, os magistrados mais altos acabam por
confiscar o poder, quando lhes concedem tempo.
As boas instituições conservam-se não apenas pelo afastamento do que
pode corrompê-las, como também, às vezes, pela suposição de um perigo
próximo. O medo torna mais atento à segurança do Estado. Assim, aqueles que
velam pela sua segurança devem inventar de tempos em tempos alguns perigos
e tornar mais próximos os perigos que estão distantes, a fim de que os
cidadãos informados estejam sempre alertas, como sentinelas noturnas.
Também se deve, se possível, cuidar através de leis, ou pelo menos prestar
atenção, para que não surjam animosidades e sedições entre os grandes, e
abafá-las antes até que tenham começado e atingido os que nada tinham com
isso. Mas nem todos têm a capacidade de dar-se conta do mal em seu começo.
É o privilégio dos políticos profundos.
Se houver alguma variação na oligarquia ou no Estado a respeito dos
impostos e do censo, como quando, permanecendo o mesmo o imposto, a
abundância do numerário aumenta, cumpre aumentar ou diminuir a taxa através
de uma nova ordenação, proporcional ao aumento ou à diminuição do
numerário. Pois se não se seguir esta regra, nas oligarquias e nas Repúblicas,
acontecerá ou que, no caso de aumento do censo, a República se transforme
em oligarquia e a oligarquia em despotismo, ou que, no caso de diminuição, a
República se transforme em democracia e a oligarquia em República ou em
democracia.
Os homens facilmente se corrompem pela prosperidade, pois nem todos
são capazes de suportá-la. Portanto, trata-se de uma regra geral para todo
governo, democrático, oligárquico, monárquico ou outro, não valorizar demais
quem quer que seja e não distribuir nenhuma honra excessiva, mesmo que
breve. Se se acumulam muitos cargos em uma só pessoa, tais cargos devem
ser-lhe retirados aos poucos, e não todos de uma vez. Será sobretudo
conveniente estabelecer através das leis que ninguém possa adquirir poder,
crédito ou riqueza demais, ou que sejam afastados os que tiverem demais.
E como da própria vida privada podem vir novidades perigosas, é
necessário que haja um magistrado para observar todo gênero de vida que se
chocar com a forma e o espírito do governo, qualquer que seja ele, democrático,
republicano, oligárquico ou outro, a fim de manter a tranqüilidade pública em
todas as partes. 
Se alguma facção ou classe do Estado assume demasiada ascendência, o
remédio é confiar sempre ao partido contrário os cargos e os empregos, opor
as pessoas distintas à massa e os pobres aos ricos, misturar com os ricos a
multidão dos indigentes ou fortalecer o partido médio para romper os projetos
sediciosos da desigualdade.
Mas, em toda a política, não há máxima mais importante do que fazer com
que as magistraturas não sejam lucrativas. Isto convém sobretudo às
oligarquias. O vulgo zanga-se menos por estar excluído do governo do que por
ver os magistrados viverem às custas do tesouro público. É até muito cômodo
dispor de todo o tempo para cuidar dos negócios particulares. Mas se estiver
persuadido de que os titulares dos cargos públicos pilham o Estado, terá a
dupla vexação de estar afastado tanto dos cargos públicos quanto dos lucros
pecuniários.
Esta gratuidade é a única maneira de aliar, por assim dizer, a democracia à
aristocracia. Ela concede aos nobres e ao vulgo o que desejam. Por um lado,
admite sem distinção todos no governo, que é o procedimento da democracia;
por outro lado, o que é uma concepção aristocrática, só concede magistraturas
aos nobres. Isto se torna fácil se se retiram dos homens públicos todos os meios
de tirar proveito de suas magistraturas. Então, os pobres não se preocuparão
com estes cargos, mas preferirão exercer sua profissão e cuidar de seus
negócios, e os ricos, não precisando de salários para viver, aceitarão mais
facilmente os cargos não pagos. Disto resultará também que os pobres, tendo
tempo para trabalhar, alcançarão mais facilmente a riqueza, e os nobres não
correrão o risco de depender do primeiro que aparecer.
Para prevenir a espoliação do tesouro público, é preciso que a receita seja
feita à vista do público e as duplicatas dos impostos e dos recibos sejam
entregues às corporações, às centúrias e às tribos. De resto, os magistrados
serão menos tentados a tirar algum lucro de seus cargos se houver honras
propostas pela lei aos que os tiveram exercido liberalmente.
Nas democracias, deve-se ser prudente com os bens dos ricos e não
submeter nem suas propriedades nem suas rendas a nova partilha, como se faz
secretamente em algumas Repúblicas. Seria ainda mais sábio não obrigá-los a
grandes despesas e até mesmo proibir-lhes as que são apenas aparatosas,
sem serem úteis para o povo, como espetáculos, iluminações e outras coisas
semelhantes. 
Da mesma forma, nas oligarquias, é preciso ter muita atenção para com os
indigentes e distribuir-lhes os empregos lucrativos. No caso de algum rico os
ultrajar, será punido mais severamente do que se tivesse insultado um igual.
É preciso que as heranças não se transmitam, por testamento, a
estrangeiros, mas, por sucessão, às pessoas da família, e que cada um só
possa receber uma. Desta forma, haverá maior igualdade entre as riquezas e
um maior número de pobres poderá tornar-se rico.
Na democracia e na oligarquia, convém que os que participam menos do
governo, como os ricos na democracia e, na oligarquia, os pobres, sejam em
tudo o mais tratados igualmente, se não melhor, a menos que se trate da
suprema autoridade, que deve ser reservada aos que a forma do governo
indica, isto é, ao magistrado único ou ao Senado.


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