Citações
"A esperança é a última a morrer. Diz-se. Mas não é verdade. A esperança não morre por si mesma. A esperança é morta. Não é um assassínio espetacular, não sai nos jornais. É um processo lento e silencioso que faz esmorecer os corações, envelhecer os olhos dos meninos e nos ensina a perder a crença no futuro". [8]
"Todos nós somos impossíveis tradutores de sonhos. Na verdade, os sonhos falam em nós o que nenhuma palavra sabe dizer". [12]
"A palavra de hoje é cada vez mais aquela que se despiu da dimensão poética e que não carrega nenhuma utopia sobre um mundo diferente". [13]
"...onde a palavra tem de lutar para não ser silêncio". [13]
"O que me move é a vocação divina da palavra, que não apenas nomeia mas que inventa e produz encantamento". [14]
"Mas quem escreve quer dizer coisas que estão além da vida quotidiana. Nunca o nosso mundo teve ao seu dispor tanta comunicação. E nunca foi tão dramática a nossa solidão. Nunca houve tanta estrada. E nunca nos visitamos tão pouco". [14]
"Sou biólogo e viajo muito pela sava do meu país. Nessas regiões encontro gente que não sabe ler livros. Mas que sabe ler o mundo. Nesse universo de outros saberes, sou eu o analfabeto. Não sei ler sinais da terra, das árvores e dos bichos. Não sei ler nuvens, nem o prenúncio das chuvas. Não sei falar com os mortos, perdi contato com os antepassados que nos concedem o sentido da eternidade. Nessas visitas que faço à savana, vou aprendendo, sensibilidades que me ajudam a sair de mim e a afastar-me das minhas certezas. Nesse território, eu não tenho apenas sonhos. Eu sou sonhável". [15]
"As culturas sobrevivem enquanto se mantiverem produtivas, enquanto forem sujeito de mudança e elas próprias dialogarem e se mestiçarem com outras culturas". [16]
"...na ingênua esperança de que a tecnologia é a salvação para problemas de entendimento e de comunicação". [17]
"Em algumas línguas de Moçambique não existe a palavra "pobre". Um pobre é designado como sendo chisiwana, expressão que quer dizer órfão. Nessas culturas, o pobre não é apenas o que não tem bens, mas é sobretudo o que perdeu a rede de relações familiares que, na sociedade é pobre rural, serve de apoio à sobrevivência. O indivíduo é pobre quando não tem parentes. A pobreza é a solidão, a ruptura com a família". [20]
"A ideia de meio ambiente, pressupõe que nós, humanos estamos no centro e as coisas moram à nossa volta. Na realidade, as coias não nos rodeiam, nós formamos com elas um mesmo mundo, somos coisas e gente habitando um indivisível corpo". [21]
"Os escritores africanos desejam ser tão universais como qualquer outro escritor do mundo". [22]
"...eles estão reinventado continentes dentro de si mesmos". [22]
"Não existe escritor no mundo que não tenha de procurar uma identidade própria entre identidades múltiplas e fugidias". [23]
"Mas a verdade, meus amigos, é que nenhum escritor tem ao seu dispor uma língua já feita. Todos nós temos de encontrar uma língua própria que nos revele como seres únicos e irrepetíveis". [23]
"O único segredo, a única sabedoria é sermos verdadeiros, não temos medo de partilhar publicamente as nossas fragilidades. É isso que venho fazer, partilhar convosco algumas das minhas dúvidas, das minhas solitárias cogitações". [26]
"A pergunta crucial é esta: O que nos separa desse futuro que todos queremos? Alguns acreditam que o que falta são mais quadros, mais escolas, mais hospitais. Outros acreditam que precisamos de mais investidores, mais projectos económicos. Tudo isso é necessário, tudo isso é imprescindível. Mas para mim há uma outra coisa que é nova atitude. Se não mudarmos de atitude não conquistaremos uma condição melhor. Poderemos ter mais técnicos, mais hospitais, mais escolas, mas não seremos construtores de futuro". [29]
"Estou completamente cansado de pessoas que só pensam numa coisa: queixar-se e lamentar-se num ritual em que nos fabricamos mentalmente como vítimas. Choramos e lamentamos, lamentamos e choramos. Queixamo-nos até a náusea sobre o que os outros fizeram e continuam a fazer. E pensamos que o mundo nos deve qualquer coisa. Lamento dizer-vos que isto não passa de uma ilusão. Ninguém nos deve nada. Ninguém está disposto a abdicar daquilo que tem, com a justificação de que nós também queremos o mesmo. Se quisermos algo temos que o conquistar. Não podemos continuar a mendigar, meus irmãos e minhas irmãs". [31]
"A noite sugere o lugar encantado dos contadores de histórias". [49]
"...creio ser tão necessário em nossos dias... reencantar o mundo". [49]
"Para merecer credenciais científicas as nossas acções precisam de ter uma seriedade quase ascética". [50]
"...indisciplina científica, um modo de estar mais próximo das perguntas do que respostas". [51]
"Acredito na ciência, sim, mas apenas como um dos caminhos do saber. Existem outros caminhos do saber. Existem outros caminhos e quero estar disponível para os percorrer. Uma parte da nossa formação científica confunde-se com a actividade de um polícia de fronteiras, revistando os pensamentos de contrabando que viajam na mala de outras sabedorias. Apenas passam os pensamentos de carimbada cientificidade. [51]
"Eu tenho para mim que o maior inimigo do escritor pode ser a própria literatura. Pior que não escrever um livro, é escrevê-lo demasiadamente". [63]
"O homem passa meses do ano prestando visitas aos vizinhos e familiares distantes. As visitas parecem não ter propósito prático e definido. Quando se pergunta a um desses visitantes qual a finalidade da sua viagem ele responde: "Só venho visitar". Na realidade, prestar visitar é uma forma de prevenir conflitos e construir laços de harmonia que são vitais numa sociedade dispersa e sem mecanismos estatais que garantem estabilidade". [70]
"Todos nós convivemos com diversos eus, diversas pessoas reclamando a nossa identidade. O segredo é permitir que as escolhas que a vida nos impõe não nos obriguem a matar a nossa diversidade interior". [80]
"Na filosofia africana cada um é porque é os outros. Ou dito de outro modo: eu sou todos os outros. Chega-se a essa identidade colectiva por via da família". [81]
"A própria noção de distância deixou de ser medida em termos de quilómetros. Queremos saber se para onde vamos há rede telefónica. O fim do mundo é onde não há cobertura de antena". [83]
"Vivemos numa sociedade que tem uma característica muito curiosa: aqui glorifica o indivíduo mas nega-se a pessoa... Indivíduo é um ser anónimo, sem rosto e sem contorno existencial. A história de cada um de nós é a de um indivíduo a caminho de ser pessoa. O que nos faz pessoas não é o Bilhete de Identidade. O que nos faz pessoas é aquilo que não cabe no Bilhete de Identidade. O que nos faz pessoas é o modo como pensamos, como sonhamos, como somos outros... Um dos problemas do nosso tempo é que perdemos a capacidade de fazermos as perguntas que são importantes. A escola nos ensinou apenas a dar respostas, a vida nos aconselha a que fiquemos quietos e calados.". [84]
"A cilada maior é acreditarmos que as armadilhas estão sempre fora de nós, num mundo que temos por cruel e desumano.Ora, por muito que nos custe, nós somos também esse mundo. E as armadilhas que pensávamos exteriores residem profundamente dentro de nós. Quebrar as armadilhas do mundo é, antes de mais, quebrar o mundo das armadilhas em que se converteu o nosso próprio olhar". [98]
"Ensinar a ler é sempre ensinar a transpor o imediato. É ensinar a escolher entre sentidos visíveis e invisíveis. É ensinar a pensar no sentido original da palavra "pensar" que significa "curar" ou "tratar" um ferimento. Temos de repensar o mundo no sentido terapêutico de o salvar das doenças de que padece". [99]
"A imensa felicidade que a escrita me deu foi a de poder viajar por entre categorias existenciais. Na realidade, de pouco vale a leitura se ela não nos fizer transitar de vidas. De pouco vale escrever ou ler se não deixarmos dissolver por outras identidades e não reacordarmos em outros corpos, outras vozes... "...é estar disponível para que outras lógicas nos habitem, é visitarmos e sermos visitados por outras sensibilidades". [101]
"O livro só cumpre o seu destino quando transitamos de leitores para produtores do texto, quando tomamos posse dele como seus co-autores". [102]
"Nós lemos emoções nos rostos, lemos os sinais climáticos nas nuvens, lemos o chão, lemos o Mundo, lemos a Vida. Tudo pode ser página. Depende apenas da intenção de descoberta do nosso olhar. Queixamos-nos de que as pessoas não lêem livros. Mas o deficit de leitura é muito mais geral. Não sabemos ler o mundo, não lemos os outros". [103]
"A infância é quando ainda não é demasiado tarde para nos surpreendermos, para nos deixarmos encantar". [104]
"A escrita não é um veículo para chegar a uma essência, a uma verdade. A escrita é a viagem interminável. A escrita é a descoberta de outras dimensões, o desvendar de mistérios que estão para além das aparências". [114]
"...é fácil (embora se vá tornando raro) ser-se solidário com os outros. Difícil é sermos os outros. Nem que seja por um instante, nem que seja de visita". [139]
"Dizemos que somos tolerantes com as diferenças. Mas ser-se tolerante é ainda insuficiente.É preciso aceitar que a maior parte das diferenças foi inventada e que o Outro (o outro sexo, a outra raça, a outra etnia) existe sempre dentro de nós". [135]
"Nós homens conhecemos aquelas com quem partilhamos a Vida e o Mundo. Receamos aquilo que elas pensam, sentimo-nos ameaçados com o que elas sentem... Provavelmente, a mulher sofre da mesma dificuldade de ser o Outro e de viajar pela alma do Homem". [136]
"É que nenhum homem é distante. Todo o homem se torna próximo na luta a favor da humanidade". [137]
"Do rio que tudo arrasta se diz violento, mas ninguém diz que são violentas as margens que comprimem esse mesmo rio". [144]
"O desespero é saber que esse destino a que chamamos de futuro é comandado por entidades que deixaram de olhar para nós como seres humanos". [144]
"...governar é tão fácil que todos o sabem fazer até o dia em que são governos. [146]
"Mais grave que o ruído causado pelos homens maus é o silêncio cúmplice dos homens bons que aceitam a resignação do silêncio". [146]
"Porque toda cultura vive da sua própria diversidade. A cultura diz-se sempre no plural". [164]
"Ora o escritor usa a língua dentro da língua, uma pátria que ele inventa não para viver mas para sonhar. Ele não se serve da língua, o criador literário é inventado pela língua. O que ele sabe são ignorâncias, ele é um especialista em ausências e silêncios". [173] - (Acho que Mia Couto andou lendo Manoel de Barros)
"A velocidade que possibilita a deslocação acabou matando a viagem. Com ela se extinguiu a transição pausada entre gentes e lugares, essa travessia que convoca travessias das nossas próprias paisagens interiores". [174]
"Sim, as línguas são as mais poderosas agências de viagens, os mais antigos e eficazes veículos de trocas". [174]
"Não é de um tempo que tenho saudade. Saudade tenho é de não haver tempo nenhum". [186]
"O silêncio é, tanto quanto a palavra, um momento vital de partilha de entendimentos". [187]
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