Citações
"Três tipos de discursos - discurso lúdico, discurso polêmico e discurso autoritário. O discurso pedagógico (DP) se apresenta como um discurso autoritário." [15]
"O referente e os participantes do discurso, o objeto do discurso e os interlocutores... há dois processos - o parafrástico e o polissêmico. A polissemia representa a tensão constante estabelecida pela relação homem/mundo... podemos caracterizar os três tipos de discursos da seguinte maneira: o discurso lúdico é aquele em que o seu objeto se mantém presente e os interlocutores se expõem a essa presença, resultando disso o que chamaríamos de polissemia aberta (o exagero é o non-sense). O discurso polêmico mantém a presença do seu objeto, os participantes não se expõem, mas ao contrário procuram dominar o seu referente... o que resulta na polissemia controlada. No discurso autoritário, o referente está ausente, oculto pelo dizer; não há realmente interlocutores, mas um agente exclusivo, o que resulta na polissemia contida (o exagero é a ordem... Esse discurso recusa outra forma de ser que não a linguagem." [15]
"O DP aparece como discurso do poder... o discurso que cria a noção de erro... A estratégia, a posição final, aparece como o esmagamento do outro. Nesse sentido, poderíamos dizer que A ensina B = A influencia B. [17]
Ensinar
"Mais do que informar, explicar, influenciar ou mesmo persuadir, ensinar aparece como inculcar. Podemos caracterizar a inculcação através de vários fatores próprios ao discurso e que fazem parte da ordem social em que vivemos." [17]
"A lei de informatividade diz que: se se quer informar é preciso que o ouvinte desconheça o fato que se lhe aponta." [17]
"Lei do interesse: lei geral do discurso segundo a qual não se pode falar legitimamente a outrem senão daquilo que possa interessar-lhe." [17]
"Lei da utilidade: lei "psicológica" segundo a qual não se fala somente por falar, mas porque há uma utilidade em fazê-lo... dessa concepção utilitarista da linguagem considera-se razoável indagar, para ada ato de fala, os motivos que poderiam tê-lo suscitado." [18]
"No DP há mascaramento." [18]
"...uma vez que o professor é uma autoridade na sala de aula e não só mantém como se serve dessa garantia dada pelo seu lugar na hierarquia, o recurso didático, para mascarar a quebra das leis de interesse e de utilidade, é a chamada motivação que cria interesse, que cria uma visão de utilidade, fazendo com que o DP apresente as razões do sistema como razões de fato." [18]
"...a desrazão cede lugar à mediação da motivação que cria interesse, utilidade, etc. Essa motivação tem validade na esfera do sistema de ensino e deriva dos valores sociais que se lhe atribui." [18]
"Ao nível da linguagem sobre o objeto, o uso de dêiticos, a objetalização (isso), a repetição, perífrases. Ao nível da metalinguagem, definições rígidas, cortes polissêmicos, encadeamentos automatizados que levam a conclusões exclusivas e dirigidas. Daí a estranheza de um discurso que é diluidor, em relação ao objeto, ao mesmo tempo em que apresenta definições categóricas e é extremamente preciso e coerente, ao nível da metalinguagem." [19]
"A transmissão de informação e fixação são consideradas objetivos do DP... sua característica está em que ele se pretende científico. O estabelecimento da cientificidade do DP pode ser observado especialmente em dois pontos: a) a metalinguagem e b) a apropriação do cientista feita pelo professor." [19]
"A metalinguagem tem um espaço institucional para existir. Na realidade, não há questão sobre o objeto do discurso, isto é, seu conteúdo referencial, apresentando-se assim um só caminho: o do discurso institucionalizado, legal (ou legítimo, aquele que se deve ter). O conteúdo aí é a forma (artefato) e se aponta a forma como réplica do conteúdo." [19]
"As divisões são estanques e a perda da unidade é recuperada em um outro conceito que toma seu lugar: o da 'homogeneidade'. A homogeneidade é criada a partir da instituição." [20]
"Desconhece-se a história dos conceitos, ou melhor, que os conceitos têm uma história." [21]
"...atribui-se um estatuto de necessidade, através da avaliação que a escola produz, instituindo um conhecimento que é considerado valorizado ou, em outras palavras um saber legítimo." [21]
"O professor apropria-se do cientista e se confunde com ele sem que se explicite sua voz de mediador. Há aí um apagamento, isto é, apaga-se o modo pelo qual o professor apropria-se do conhecimento do cientista, tornando-se ele próprio possuidor daquele conhecimento. A opinião assumida pela autoridade professoral torna-se definitória (e definitiva). [21]
"A voz do saber fala no professor." [21]
"É assim que se resolve a lei da informatividade e, de mistura, a do interesse e utilidade: a fala do professor informa, e, logo, tem interesse e utilidade. O professor diz que e, logo sabe que, o que autoriza o aluno, a partir de seu contato com o professor, a dizer que sabe, isto é, ele aprendeu." [21]
"A distância entre a imagem ideal e o real é preenchida por presunções, mediação essa que não é feita no vazio mas dentro de uma ordem social dada com seus respectivos valores." [21]
"...o material didático, que tem esse caráter de mediação e cuja função sofre o processo de apagamento (como toda mediação) e passa de instrumento a objeto. Enquanto objeto, o material didático anula sua condição de mediador." [22]
"A reflexão é substituída pelo automatismo, porque, na realidade, saber o material didático é saber manipular." [22]
A ESCOLA (O ONDE):
A REPRODUÇÃO CULTURAL, A LEGITIMIDADE
"...a escola é a sede da reprodução cultural e o sistema de ensino é a solução mais dissimulada para o problema da transmissão de poder, pois contribui para a reprodução de estrutura das relações de classe dissimulando, sob a aparência da neutralidade." [22]
"...a escola tem uma função de dissimulação: apresenta hierarquias sociais e a reprodução dessas como se estivessem baseadas na hierarquia de 'dons', méritos ou competências e não como hierarquia fundada na afirmação brutal de relações de força. Convertem hierarquias sociais em hierarquias escolares e com isso legitimam a perpetuação da ordem social".
[22]
"O DP aparece como algo que deve ser." [23]
"Posso considerar a linguagem como um trabalho. No sentido que não tem um caráter nem arbitrário nem natural, mas necessário." [25]
"..a mediação como relação constitutiva, ação que modifica, que transforma." [25]
"O estudo da linguagem... em se tratando de processos, não consideramos nem a sociedade como um dado nem a linguagem como um produto." [26]
"A análise do Discurso como uma região privilegiada porque o discurso pode ser visto como a instanciação do modo de se produzir linguagem, no processo discursivo se explicita o modo de existência da linguagem que é social." [26]
"...o sujeito que produz linguagem também está reproduzido nela, acreditando ser a fonte exclusiva de seu discurso, quado na realidade, retoma um sentindo preexistente." [27]
"...a relação entre as condições sócio-históricas e as significações de um texto é constitutiva e não secundária." [27]
"...a produção da linguagem se faz na articulação de dois grandes processos: o parafrástico e o polissêmico. Isto é, de um lado, há um retorno constante a um mesmo dizer sedimentado - a paráfrase - e, do outro, há no texto uma tensão que aponta para o rompimento." [27]
"...o social aparece em relação à linguagem, na sua força contraditória: porque o social é constitutivo da linguagem... e porque é fato social, ela muda (polissemia)." [28]
"...hoje a educação é encarada imediatamente como capital, produção e investimento que deve gerar lucro social." [28]
"...existem, fundamentalmente, três tripos de discurso em seu funcionamento: o lúdico, o polêmico e o autoritário. O critério para a distinção está na relação entre os interlocutores e o referente, isto é, nas suas condições de produção." [29]
"A reversibilidade na relação dos interlocutores pode fazer parte do critério de distinção desses tipos de discurso, ou melhor, desses fundamentos discursivos: o discurso autoritário procura estancar a reversibilidade; o lúdico vive dela; no polêmico, a reversibilidade se dá sob condições." [29]
"Procurando caracterizar o DP, pudemos observar que tal qual ele se mostra atualmente em uma formação social como a nossa, ele se apresenta como um discurso autoritário, logo, sem nenhuma neutralidade." [29]
"O DP se dissimula como transmissor de informação, e faz isso caracterizando essa informação sob a rubrica da cientificidade." [29]
"O que o professor diz se converte em conhecimento, o que autoriza o aluno, a partir de seu contato com o professor, no espaço escolar, na aquisição da metalinguagem, a dizer que sabe: a isso se chama escolarização." [31]
"Enquanto for aluno, 'alguém' resolve por ele, ele ainda não sabe o que verdadeiramente lhe interessa, etc. Isso é a inculcação. As mediações, nesse jogo ideológico, se transformam em fins em si mesmas e as imagens que o aluno vai fazer de si mesmo, do seu interlocutor e do objeto de conhecimento vão estar dominadas pela imagem que ele deve fazer do lugar do professor." [31]
"Do ponto de vista do autor (professor) uma maneira de se colocar na forma polêmica é construir seu texto, seu discurso, de maneira a expor-se a efeitos de sentidos possíveis, é deixar um espaço para a existência do ouvinte como 'sujeito'. Isto é, é deixar vago um espaço para o outro (ouvinte) dentro do discurso e construir a própria possibilidade de ele mesmo (locutor) se colocar como ouvinte. É saber ser ouvinte do próprio texto do outro." [32]
"Da parte do aluno, uma maneira de instaurar o polêmico é exercer sua capacidade de discordância, isto é, não aceitar aquilo que o texto propõe e o garante em seu valor social: é a capacidade do aluno de se construir ouvinte e se construir como autor na dinâmica da interlocução, recusando tanto a fixidez do dito como a fixação do seu lugar como ouvinte. Ou seja, é próprio do discurso autoritário fixar o ouvinte na posição de ouvinte e o locutor na posição de locutor. Negar isso não é negar a possibilidade de ser ouvinte, é não aceitar a estagnação nesse papel, nessa posição." [33]
"...tanto emissor quanto receptor são, de direito, produtores da instância de interlocução, ambos interagem simultaneamente, embora, de fato, cada um tenha seu tempo de atuação." [33]
"...considerando a apropriação da língua pelo sujeito falante, as formas linguísticas que revelam a subjetividade na linguagem, que organizam as relações espaciais e temporais em torno do 'sujeito tomado como ponto de referência.' Mas como 'nenhum dos dois termos se concebe sem o outro', o que propomos é que se considere o outro pólo, o do ouvinte, e se procure suas marcas, as formas linguísticas que revelam seu papel." [34]
"...dizer não é apenas informar, nem comunicar, nem inculcar, é também reconhecer pelo afrontamento ideológico. Tomar a palavra é um ato dentro das relações de um grupo social." [34]
"Há, em relação à escola, uma seleção que decide, de antemão, quem faz parte dela e quem não faz, quem está em condições de se apropriar desse discurso e quem não está. Há, entretanto, um outro processo, interno, que não é o da simples seleção mas o do esmagamento do outro." [34]
"Há um artigo de Marilena Chauí, na revista Educação e Sociedade (1980), onde há colocações fecundas sobre o problema da educação. Ficam entretanto, a meu ver, certos pontos passíveis de discussão a respeito de ideologia." [35]
"E o 'talvez' usado na expressão (talvez porque tenhamos boas intenções) revela, em termos de análise de discurso, agora voltadas para o próprio texto de Marilena, uma questão que podemos fazer-lhe: que voz é essa que fala em seu discurso?" [35]
"...nós, professores, estamos excluídos desse dizer-ato-decisão quando se trata do discurso do poder que se pronuncia sobre a educação definindo seu conteúdo, sua forma, seu sentido, sua finalidade. Mas gostaria de acrescentar que, enquanto professores, não estamos excluídos do dizer-ato-decisão quando se trata do trabalho pedagógico." [35]
"Também não vejo o procedimento autoritário como o de simples e pura exclusão, trata-se antes de dominação, e o dominador não exclui o dominado, o incorpora como tal." [35]
"...deve-se questionar os implícitos, os locutores, o conteúdo, a finalidade, o sentido dado ao ensino pelo DP do poder e, de outro, fazer a mesma coisa com o discurso que nós reproduzimos internamente no trabalho pedagógico. Isto é, questionar as condições de produção desses discursos." [35]
"...uma pedagogia crítica deveria interrogar esse risco cotidiano: de onde vem e por que vem a sedução do tornar-se 'guru', de onde vem o por que em vem nós e nos alunos o desejo de que haja um mestre, o apelo à figura de autoridade" [35]
"Marilena traz à tona com muita propriedade é a questão da maturidade e imaturidade atribuídos aos que participam do processo da educação." [36]
"se fizermos falar o silêncio da imaturidade o discurso sobre a imaturidade permanecerá intacto?" [36]
"Não há separação entre o silêncio do oprimido (da imaturidade)
e o discurso do opressor (da maturidade). Dentro de um está o outro e se sussurram." [36]
"...o momento crítico, aquele em que se estabelece uma relação menos hierarquizada entre interlocutores, o da disputa pela posse da palavra." [37]
"...seria o autoritarismo um mal de raiz o DP? Hoje, sendo um discurso institucional, reflete relações institucionais das quais faz parte; se essas relações são autoritárias, ele será autoritário." [37]
"...nada nos impede de imaginar uma sociedade sem escola." [37]
"...nossa realidade é a de buscarmos, professores e alunos, um DP que seja pelo menos polêmico e que não nos obrigue a nos despirmos de tudo que é vida lá fora ao atravessarmos a soleira da porta da escola." [37]
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