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quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Mutação - Rosilda Silva

Mutação

 E eu que já fui rosa,
Já perfumei caminhos,
Já povoei de doces lembranças
Teus sonhos, encantos e desejos,
Hoje sou só roseira.
Sem flores,
Sem viço,
Só espinhos.
Deixo por onde passo
O vermelho sangue
Dos dedos que em meus galhos 
Rasgou-se.

Deixo a dor mais doída,
Pungente e amarga
Que em meus ramos
Embrenhou-se.
Perfume já não há.
As flores murcharam.
Do viço,  só as lembranças.
É com espinhos que hoje marco passagem
E traço a escrita mal feita que agora sou.
Deixei pra trás a rosa que fui
E tornei-me a roça exaustiva
Num dia de sol, calor e sem água.
Sofro, gemo e me arrebento por dentro.
Saudades do jardineiro que tive,
Da chuvinha fina renovadora,
Da terra fofa e adubada,
Da mão carinhosa em meu verde,
Do olhar fascinado pras cores.
Saudade do teu pescoço virando,
Procurando meu cheiro,
Seguindo meu rastro.
Da rosa que fui um dia
Nem roça amarga sou mais.
Tornei-me rocha.
Sem cheiro,
Sem cor,
Sem jardim.
Pedra fria e sem vida.
Matéria-prima sem escultor. À espera quem sabe,
Que por aqui chova novamente
Produzindo outra vez
O som da esperança.
Para quebrar a rocha,
Renovar a cor

E resgatar o aroma.

Um comentário:

Unknown disse...

Linda poesia, amarga, sem perder a esperança.