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sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Milton - Milton Nascimento (1970)


Esaú e Jacó - Machado de Assis [parte 2]

       —Não faz mal. Cousas futuras!
        —Que cousas serão?
        —Não sei; futuras.
Mergulharam outra vez no silêncio. Ao entrar no Catete, Natividade recordou a manhã em que ali passou, naquele mesmo coupé, e confiou ao marido o estado de gravidez. Voltavam de uma missa de defunto, na igreja de S. Domingos...
"Na igreja de S. Domingos diz-se hoje uma missa por alma de João de Melo, falecido em Maricá". Tal foi o anúncio que ainda agora podes ler em algumas folhas de 1869. Não me ficou o dia. o mês foi agosto. O anúncio está certo, foi aquilo mesmo, sem mais nada, nem o nome da pessoa ou pessoas que mandaram dizer a missa, nem hora, nem convite. Não se disse sequer que o defunto era escrivão, ofício que só perdeu com a morte. Enfim, parece que até lhe tiraram um nome; ele era, se estou bem informado, João de Melo e Barros.
Não se sabendo quem mandava dizer a missa, ninguém lá foi. A igreja escolhida deu ainda menos relevo ao ato; não era vistosa, nem buscada, mas velhota, sem galas nem gente, metida ao canto de um pequeno largo, adequada à missa recôndita e anônima.
As oito horas parou um coupé à porta; o lacaio desceu, abriu a portinhola, desbarretou-se e perfilou-se. Saiu um senhor e deu a mão a uma senhora, a senhora saiu e tomou o braço ao senhor, atravessaram o pedacinho de largo e entraram na igreja. Na sacristia era tudo espanto. A alma que a tais sítios atraíra um carro de luxo, cavalos de raça, e duas pessoas tão finas não seria como as outras almas ali sufragadas. A missa foi ouvida sem pêsames nem lágrimas. Quando acabou, o senhor foi à sacristia dar as espórtulas. O sacristão, agasalhando na algibeira a nota de dez-mil-réis que recebeu, achou que ela provava a sublimidade do defunto; mas que defunto era esse? O mesmo pensaria a caixa das almas, se pensasse, quando a luva da senhora deixou cair dentro uma pratinha de cinco tostões. Já então havia na igreja meia dúzia de crianças maltrapilhas, e fora, alguma gente às portas e no largo, esperando. O senhor, chegando à porta, relanceou os olhos, ainda que vagamente, e viu que era objeto de curiosidade. A senhora trazia os seus no chão. E os dous entravam no carro, com o mesmo gesto, o lacaio bateu a portinhola e partiram.

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Cio da Terra - Milton Nascimento e Chico Buarque


ESAÚ E JACÓ - Machado de Assis [parte 1]

 Dico, che quando l'anima mal nata...
Dante
 
I
Cousas futuras!
 
 
Era a primeira vez que as duas iam ao morro do Castelo. Começaram de subir pelo lado da Rua do Carmo. Muita gente há no Rio de Janeiro que nunca lá foi, muita haverá morrido, muita mais nascerá e morrerá sem lá pôr os pés. Nem todos podem dizer que conhecem uma cidade inteira. Um velho inglês, que aliás andara terras e terras, confiava-me há muitos anos em Londres que de Londres só conhecia bem o seu clube, e era o que lhe bastava da metrópole e do mundo Natividade e Perpétua conheciam outras partes, além de Botafogo, mas o morro do Castelo, por mais que ouvissem falar dele e da cabocla que lá reinava em 1871, era-lhes tão estranho e remoto como o clube. O íngreme, o desigual, o mal calçado da ladeira mortificavam os pés às duas pobres donas. Não obstante, continuavam a subir, como se fosse penitência, devagarinho, cara no chão, véu para baixo. A manhã trazia certo movimento; mulheres, homens, crianças que desciam ou subiam, lavadeiras e soldados, algum empregado, algum lojista, algum padre, todos olhavam espantados para elas, que aliás vestiam com grande simplicidade; mas há um donaire que se não perde, e não era vulgar naquelas alturas. A mesma lentidão do andar, comparada à rapidez das outras pessoas, fazia desconfiar que era a primeira vez que ali iam. Uma crioula perguntou a um sargento: "Você quer ver que elas vão à cabocla?" E ambos pararam a distancia, tomados daquele invencível desejo de conhecer a vida alheia, que é muita vez toda a necessidade humana.
Com efeito, as duas senhoras buscavam disfarçadamente o número da casa da cabocla, até que deram com ele. A casa era como as outras, trepada no morro. Subia-se por uma escadinha, estreita, sombria, adequada à aventura. Quiseram entrar depressa, mas esbarraram com dous sujeitos que vinham saindo, e coseram-se ao portal. Um deles perguntou-lhes familiarmente se iam consultar a adivinha.
        —Perdem o seu tempo, concluiu furioso, e hão de ouvir muito disparate...
        —É mentira dele, emendou o outro rindo; a cabocla sabe muito bem onde tem o nariz.
Hesitaram um pouco; mas, logo depois advertiram que as palavras do primeiro eram sinal certo da vidência e da franqueza da adivinha; nem todos teriam a mesma sorte alegre. A dos meninos de Natividade podia ser miserável, e então... Enquanto cogitavam passou fora um carteiro, que as fez subir mais depressa, para escapar a outros olhos. Tinham fé, mas tinham também vexame da opinião, como um devoto que se benzesse às escondidas.
Velho caboclo, pai da adivinha, conduziu as senhoras à sala. Esta era simples, as paredes nuas, nada que lembrasse mistério ou incutis se pavor, nenhum petrecho simbólico, nenhum bicho empalhado: esqueleto ou desenho de aleijões. Quando muito um registro da Conceição colado à parede podia lembrar um mistério, apesar de encardido e roído, mas não metia medo. Sobre uma cadeira, uma viola.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Jason Mraz - Circuito Banco do Brasil 2013 - Completo


Valeu, Amigo - Mc Pikeno e Menor


I'm yours - Jason Mraz


Vinícius de Moraes - Documentário Completo


A Escrava Isaura - Bernardo Guimarães [parte final]

- Plano admirável na verdade, Leôncio! - exclamou Jorge
enfaticamente.
- Tens um tino superior, e uma inteligência sutil e fértil em
recursos!., se te desses á política, asseguro-te que farias um papel
eminente; serias um estadista consumado. Esse Dom Quixote de nova
espécie, amparo da liberdade das escravas alheias, quando são bonitas,
não achará senão moinhos de vento a combater. Muito havemos de
nos rir de seu desapontamento, se lhe der na cabeça continuar sua
burlesca aventura.
- Creio que nessa não cairá ele; mas se por cá aparecesse, muito
tínhamos que debicá-lo.
- Meu senhor, - disse André entrando na sala, - aí estão na
porta uns cavalheiros, que pedem licença para apear e entrar.
- Ah! já sei, - disse Leôncio, - são eles, são as pessoas que
mandei chamar; o vigário, o tabelião e mais outros... bom! já não nos
falta tudo. Vieram mais depressa do que eu esperava. Manda-os apear e
entrar, André.
André sai, Leôncio toca uma campainha, e aparece Rosa.
- Rosa, diz-lhe ele, - vai já chamar sinhá Malvina e Isaura, e o
senhor Miguel e Belchior. Já devem estar prontos; precisa-se aqui já da
presença de todos eles.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Simplesmente fabuloso

Recomendo!!!

A Escrava Isaura - Bernardo Guimarães [penúltima parte]


Miguel não era homem de têmpera a lutar contra a adversidade. O
cativeiro e reclusão perene de sua filha, a miséria que se lhe antolhava
acompanhada de mil angústias, eram para ele fantasmas hediondos,
cujo aspecto não podia encarar sem sentir mortal pavor e abatimento.
Não achou muito oneroso o preço pelo qual o desumano senhor,
livrando-o da miséria, concedia liberdade à sua filha, e aceitou
o convênio.

Capítulo 20
Enquanto Rosa e André espanejavam os móveis do salão,
tagarelando alegremente, uma cena bem triste e compungente se passava em um
escuro aposento atinente às senzalas, onde Isaura sentada sobre um cepo, com
um dos alvos e mimosos artelhos preso por uma corrente cravada à
parede, há dois meses se achava encarcerada.
Miguel ai tinha sido introduzido por ordem de Leôncio, para dar
parte à filha do projeto de seu senhor, e exortá-la a aceitar o partido
que lhes propunha. Era pungente e desolador o quadro que apresentavam
aquelas duas míseras criaturas, pálidas, extenuadas e abatidas pelo
infortúnio, encerrados em uma estreita e lôbrega espelunca. Ao se
encontrarem depois de dois longos meses, mais oprimidos e desgraçados
que nunca, a primeira linguagem com que se saudaram não foi mais do
que um coro de lágrimas e soluços de indizível angústia, que abraçados
por largo tempo estiveram entornando no seio um do outro.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

A Escrava Isaura - Bernardo Guimarães [parte 15]

- Basta, senhor Martinho, - disse-lhe com mau humor; - o negócio
está arranjado; não preciso mais de seus serviços.
Arranjado!... como?...
- A escrava está em poder de seu senhor.
- De Leôncio!... impossível!
- Entretanto, é a pura verdade; se quiser saber mais vá à polícia,
e indague.
- E os meus dez contos?...
- Creio que não lhos devo mais.
Martinho soltou um urro de desespero, e saiu da casa de Álvaro
com tal precipitação, que parecia ir rolando pelas escadas abaixo.
Descrever o mísero estado em que ficou aquela pobre alma, é
empresa em que não me meto; os leitores que façam ideia.
O cão faminto, iludido pela sombra, largou a carne que tinha
entre os dentes, e ficou sem uma nem outra.

Capítulo 19
- Olha como arranjas isso, Rosa; esta rapariga é mesmo uma
estouvada; não tem jeito para nada. Bem mostras que não nasceste
para a sala; o teu lugar é na cozinha.
- Ora vejam lá a figura de quem quer me dar regras!... quem te
chamou aqui, intrometido? O teu lugar também não é aqui, é lá na
estrebaria. Vai lá governar os teus cavalos, André, e não te intrometas
no que não te importa.

domingo, 23 de fevereiro de 2014

A Escrava Isaura - Bernardo Guimarães [parte 14]

No mesmo momento entrava na sala o baleeiro de Álvaro, e
anunciava-lhe que novas pessoas o procuravam.
- Oh, meu Deus!... que será isto hoje!... serão ainda os malditos
esbirros?... - refletiu Álvaro, e depois dirigindo-se a Isaura:
- É prudente que te retires, minha amiga, - disse-lhe; ninguém
sabe o que será e não convém que te vejam.
- Ah! que eu não sirva senão para perturbar-lhe o sossego! -
murmurou Isaura retirando-se.
Um momento depois Alvaro viu entrar na sala um elegante e belo
mancebo, trajado com todo o primor, e afetando as mais polidas e
aristocráticas maneiras; mas apesar de sua beleza, tinha ele na
fisionomia, como Lusbel, um não seu quê de torvo e sinistro, e um olhar sombrio, que
incutia pavor e repulsão.
- Este por certo não é um esbirro, - pensou Álvaro, e indicando
uma cadeira ao recém-chegado: - Queira sentar-se, - disse-lhe,
e - tenha a bondade de dizer o que pretende deste seu criado.
- Desculpe-me, - respondeu-lhe o cavalheiro, passeando um
olhar escrutador em roda da sala: - não é a V. S.ª que eu desejava
falar, mas sim ao morador desta casa ou à sua filha.
Álvaro estremeceu. Estava claro que aquele mancebo, se bem que
nenhuma aparência tivesse de um esbirro, andava à pista de Isaura.
Todavia no intuito de verificar se era fundada a sua apreensão, antes de
chamar os donos da casa quis sondar as intenções do visitante.
- Não obstante, - respondeu ele, como estou autorizado pelos
donos da casa a tratar de todos os seus negócios, pode V. S.ª dirigir-se
a mim, e dizer o que deles pretende.

A Escrava Isaura - Bernardo Guimarães [parte 13]

- Qual direito?!...
- De varejar esta casa e levar à força a escrava.
- Retira-te, miserável esbirro! - bradou Álvaro com força, não
podendo mais sopear a cólera. - Desaparece de minha presença, se
não queres pagar caro o teu atrevimento!...
- Senhor Álvaro!... veja o que faz!
O Dr. Geraldo, não achando muita razão em seu amigo, por
prudência até ali se tinha conservado silencioso, mas vendo que a cólera e
imprudência de Alvaro ia excedendo os limites, julgou de seu dever intervir na questão,
e aproximando-se de Alvaro, e puxando-lhe o braço:
- Que fazes, Álvaro? - disse-lhe em voz baixa. - Não vês que
com esses arrebatamentos não consegues senão comprometer-te, e
agravar a sorte de Isaura? mais prudência, meu amigo.
- Mas... que devo eu fazer?... não me dirás?
- Entregá-la.
- Isso nunca!... - replicou Álvaro terminantemente.
Conservaram-se todos silenciosos por alguns momentos. Álvaro
parecia refletir.
- Ocorre-me um expediente, - disse ele ao ouvido de Geraldo,
- vou tentá-lo.
E sem esperar resposta aproximou-se de Martinho.
- Senhor Martinho, - disse-lhe ele, - desejo dizer-lhe duas palavras
em particular, com permissão aqui do doutor.
- Estou às suas ordens, - replicou Martinho.

sábado, 22 de fevereiro de 2014

Anais do 4º Seminário de Pesquisa em Linguagens, Leitura e Cultura



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Os VENENOS no Cigarro - Manual do Mundo

Para todo os jovens que ainda pensam em entrar nessa e em especial para os Jovens de Atitude, que disseminam a ideia de valorização da vida e promoção da saúde.

A Escrava Isaura - Bernardo Guimarães [parte 12]

Cheguei a duvidar ainda da cruel realidade. O chefe de polícia,
possuído de respeito e admiração diante de tão gentil e nobre
figura, tratou-a com toda a amabilidade, e interrogou-a com brandura e
polidez. Coberta de rubor e pejo confessou tudo com a ingenuidade de
uma alma pura. Fugira em companhia de seu pai, para escapar ao amor de
um senhor devasso, libidinoso e cruel, que a poder de violências e
tormentos tentava forçá-la a satisfazer seus brutais desejos. Mas Isaura, a
quem uma natureza privilegiada secundada pela mais fina e esmerada
educação, inspirara desde a infância o sentimento da dignidade e do
pudor, repeliu com energia heroica todas as seduções e ameaças de seu
indigno senhor. Enfim, ameaçada dos mais aviltantes e bárbaros
tratamentos, que já começavam a traduzir-se em vias de fato, tomou o partido extremo
de fugir, o único que lhe restava.
- O motivo da fuga, Álvaro, a ser verdadeiro, é o mais honroso
possível para ela, e a toma uma heroína; mas... enfim de contas ela não
deixa de ser uma escrava fugida.
- E por isso mesmo mais digna de interesse e compaixão. Isaura
tem-me contado toda a sua vida, e segundo creio, pode alegar, e talvez
provar direito à liberdade. Sua senhora velha, mãe do atual senhor, a
qual criou-a com todo o mimo, e a quem ela deve a excelente educação
que tem, tinha declarado por vezes diante de testemunhas, que por
sua morte a deixaria livre; a morte súbita e inesperada desta senhora,
que faleceu sem testamento, é a causa de Isaura achar-se ainda entre as
garras do mais devasso e infame dos senhores.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

A Escrava Isaura - Bernardo Guimarães [parte 11]

- Senhor Martinho, por favor queira não abusar mais da minha
paciência. Se não quer dizer ao que veio, ponha-se já longe da minha
presença...
- Oh! senhor! retorquiu Martinho, sem se perturbar; - já que
a isso me força, pouco me custa fazer-lhe a vontade, e com bastante
pesar tenho de declarar-lhe, que essa senhora a quem dá o braço, é
uma escrava fugida!...
Álvaro, se bem que conhecesse a vilania e impudência do caráter
de Martinho, no primeiro momento ficou pasmo ao ouvir aquela súbita
e imprevista delação. Não podia dar-lhe crédito, e refletindo um instante
confirmou-se mais na ideia de que tudo aquilo não passava de uma
farsa posta em jogo por algum indigno rival, com o fim de desgostá-lo
ou insultá-lo. A pessoa do Martinho, que não poucas vezes, na qualidade
de truão ou palhaço, servia de instrumento às vinganças e paixões
mesquinhas de entes tão ignóbeis como ele, servia para justificar a desconfiança de
Álvaro, que acabou por não sentir senão asco e indignação por tão infame
procedimento.
- Senhor Martinho, - bradou ele com voz severa, - se alguém
pagou-lhe para vir achincalhar-me a mim e a esta senhora, diga quanto
ganha, que estou pronto a dar-lhe o dobro para nos deixar em paz.
A esta sanguinolenta afronta, a larga e impudente cara do
Martinho nem de leve se alterou, e por única resposta:
- Torno a repetir, - bradou com todo o descaramento, - e em
voz bem alta, para que todos ouçam: esta senhora que aqui se acha, é
uma escrava fugida, e eu estou encarregado de apreendê-la e entregá-la
a seu senhor.

domingo, 16 de fevereiro de 2014

A Escrava Isaura - Bernardo Guimarães [parte 10]

Ora, deixem-me em paz, - disse Martinho, com os olhos
atentamente dirigidas para o salão de dança. - Estou calculando o meu jogo...
suponham que é o xadrez, e que eu vou dar xeque-mate à rainha... dito e feito, e os
cinco contos são meus...
- Não há dúvida, o rapaz está doido varrido... Anda lá, Martinho;
descobre o teu jogo, ou vai-te embora, e não nos estejas a maçar a
paciência com tuas maluquices.
- Malucos são vocês. O meu jogo é este... mas quanto me dão
para descobri-lo? olhem que é coisa curiosa.
- Queres-nos atiçar a curiosidade para nos chuchar alguns cobres,
não é assim?... pois desta vez afianço-te da minha parte, que não
arranjas nada. Vai-te aos diabos com o teu jogo, e deixa-nos cá com
o nosso. As cartas, meus amigos, e deixemos o Martinho com suas
maluquices.
- Com suas velhacarias, dirás tu... não me pilha.
- Ah! toleirões! - exclamou o Martinho, - vocês ainda estão
com os beiços com que mamaram. Andem cá, andem, e verão se é
maluquice, nem velhacaria. Enfim quero mostrar-lhes o meu jogo,
porque desejo ver se a opinião de vocês estará ou não de acordo
com a minha. Eis aqui a minha bisca. - concluiu Martinho mostrando um
papel, que sacou da algibeira; - não é nada mais que um anúncio de
escravo fugido.
- Ah! ah! ah! esta não é má!...

A Escrava Isaura - Bernardo Guimarães [parte 9]

Já bastante lhe pesava andar enganando a sociedade a respeito de
sua verdadeira condição; alma sincera e escrupulosa, envergonhava-se
consigo mesma de impor às poucas pessoas que com ela tratavam de
perto, um respeito e consideração a que nenhum direito podia ter. Mas
considerando que de tal disfarce nenhum grande mal podia resultar à
sociedade, conformava-se com sua sorte. Deveria, porém, ela, ou
poderia sem inconveniente manter o seu amante na mesma ilusão? Com
seu silêncio, conservando-o na ignorância de sua condição de escrava,
deveria deixar alimentar-se, crescer profunda e enérgica paixão, que o
moço por ela concebera?... não seria isto um vil embuste, uma
indignidade, uma traição infame? não teria ele o direito, ao saber da
verdade, de acabrunhá-la de amargas exprobrações, de desprezá-la, de calcá-la
aos pés, de tratá-la enfim como escrava abjeta e vil, que ficaria sendo?
- Oh! isto para mim seria mais horrível que mil mortes! -
exclamava ela no meio do angustioso embate de ideias que se lhe
agitavam no espírito. - Não, não devo iludi-lo; isto seria uma infâmia... vou-lhe
descobrir tudo; é esse o meu dever, e hei de cumpri-lo. Ficará sabendo
que não pode, que não deve amar-me; porém ao menos não ficará
com o direito de desprezar-me.. uma escrava, que procede com lisura e
lealdade, pode ao menos ser estimada. Não; não devo enganá-lo; hei
de revelar-lhe tudo.

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Milagre dos Peixes - Milton Nascimento


A Escrava Isaura - Bernardo Guimarães [parte 8]

Tinha ódio a todos os privilégios e distinções sociais, e é escusado
dizer que era liberal, republicano e quase socialista.
Com tais ideias Álvaro não podia deixar de ser abolicionista
exaltado, e não o era só em palavras. Consistindo em escravos uma não
pequena porção da herança de seus pais, tratou logo de emancipá-los
todos. Como porém Álvaro tinha um espírito nimiamente filantrópico,
conhecendo quanto é perigoso passar bruscamente do estado de absoluta
submissão para o gozo da plena liberdade, organizou para os seus
libertos em uma de suas fazendas uma espécie de colônia, cuja direção
confiou a um probo e zeloso administrador. Desta medida podiam resultar
grandes vantagens para os libertos, para a sociedade, e para o próprio
Álvaro.
A fazenda lhes era dada para cultivar, a título de arrendamento, e eles
sujeitando-se a uma espécie de disciplina comum, não só preservavam-se
de entregar-se à ociosidade, ao vício e ao crime, tinham segura a
subsistência e podiam adquirir algum pecúlio, como também poderiam indenizar a
Álvaro do sacrifício, que fizera com a sua emancipação. Original e excêntrico como
um rico lorde inglês, professava em seus costumes a pureza e severidade
de um quaker. Todavia, como homem de imaginação viva e coração
impressionável, não deixava de amar os prazeres, o luxo, a elegância,
e sobretudo as mulheres, mas com certo platonismo delicado, certa
pureza ideal, próprios das almas elevadas e dos corações bem formados.
Entretanto, Álvaro ainda não havia encontrado até ali a mulher que lhe
devia tocar o coração, a encarnação do tipo ideal, que lhe sorria nos
sonhos vagos de sua poética imaginação. Com tão excelentes e brilhantes
predicados, Álvaro por certo devia ser objeto de grande preocupação no mundo
elegante, e talvez o almejo secreto, que fazia palpitar o coração de mais
de uma ilustre e formosa donzela. Ele, porém, igualmente cortês e
amável para com todas, por nenhuma delas ainda havia dado o mínimo
sinal de predileção.

Programação dos cinemas em Joinville de 14 a 20/02

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

A Escrava Isaura - Bernardo Guimarães [parte 7]

O que era feito porém da nobre e infeliz Isaura durante esses
longos dias de luto, de consternação, de ansiedade e dissabores?
Desde que ouviu a leitura da carta, em que se noticiava a morte
do comendador, Isaura perdeu todas as lisonjeiras esperanças que um
momento antes Miguel fizera desabrochar em seu coração. Transida de horror,
compreendeu que um destino implacável a entregava vítima indefesa entre as mãos de
seu tenaz e desalmado perseguidor. Sabedora da miseranda sorte de sua mãe, não
encontrava em sua imaginação abalada outro remédio a tão cruel situação senão
resignar-se e preparar-se para o mais atroz dos martírios. Um cruel desalento, um
pavor mortal apoderou-se de seu espírito, e a infeliz, pálida, desfeita, e como
que alucinada, ora vagava à toa pelos campos, ora escondida nas mais
espessas moitas do pomar, ou nos mais sombrios recantos das alcovas,
passava horas e horas entre sustos e angústias, como a tímida lebre,
que vê pairando no céu a asa sinistra do gavião de garras sangrentas.
Quem poderia ampará-la? onde poderia encontrar proteção contra as
tirânicas vontades de seu libertino e execrável senhor? Só duas pessoas
poderiam ter por ela comiseração e interesse; seu pai e Malvina. Seu
pai, obscuro e pobre feitor, não tendo ingresso em casa de Leôncio, e
só podendo comunicar-se com ela a custo e furtivamente, em pouco ou
nada podia valer-lhe. Malvina, que sempre a havia tratado com tanta
bondade e carinho, ai! a própria Malvina, depois da cena escandalosa
em que colhera seu marido, dirigindo a Isaura palavras enternecidas,
começou a olhá-la com certa desconfiança e afastamento, terrível efeito
do ciúme, que torna injustas e rancorosas as almas ainda as mais
cândidas e benevolentes A senhora, com o correr dos dias, tornava-se cada
vez menos tratável e benigna para com a escrava, que antes havia
tratado com carinho e intimidade quase fraternal.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

PROGRAMA DE ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA - 8º ANO

1º TRIMESTRE

* ANÚNCIO

Pontuação
Pronomes
Produto anunciado
Público
Suporte
Informações
Finalidade do Anúncio
Linguagem sintética dos slogans
Intertextualidade
Linguagem verbal e não verbal
Veiculação de ideias
Verbo no imperativo
Advérbio
Adjetivos
Linguagem figurada: hipérbole e metáfora

PROGRAMA DE ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA – 9º ANO

1º TRIMESTRE


v  POEMA 

Linguagem figurada
Narrador e eu-lírico
Intertextualidade
Musicalidade
Efeitos sonoros – ritmos e rimas
Noções elementares de versificação (verso, estrofe e verso livre)
Conotação
Unidade de sentido
Finalidade
Suporte
Expressividade
Repetição
Escolha do vocabulário

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Boas Vindas

Queridos alunos,

           
            Mais um ano letivo se inicia, mas este tem que ser diferente.   Será preciso caminharmos juntos, trilharmos com amor, respeito, companheirismo e responsabilidade os caminhos para uma aprendizagem mais digna e significativa. É tempo de deixarmos nossas marcas para as muitas conquistas que pretendemos alcançar.
            Chegamos mais longe quando caminhamos juntos, dividimos experiências, compartilhamos sonhos e nos empenhamos em ritmar nossos passos para que os planos futuros se concretizem. Que tal construirmos juntos a mágica para um 2014 mais vibrante e cheio de realizações?

Professora Rosilda

domingo, 2 de fevereiro de 2014

A Escrava Isaura - Bernardo Guimarães [arte 6]

Cônscia de sua condição, Isaura procurava ser humilde como qualquer
outra escrava, porque a despeito de sua rara beleza e dos dotes de seu
espírito, os fumos da vaidade não lhe intumesciam o coração, nem
turvavam-lhe a luz de seu natural bom senso. Não obstante porém toda
essa modéstia e humildade transiuzia-lhe, mesmo a despeito dela, no
olhar, na linguagem e nas maneiras, certa dignidade e orgulho nativo,
proveniente talvez da consciência de sua superioridade, e ela sem o
querer sobressaía entre as outras, bela e donosa, pela correção e
nobreza dos traços fisionômicos e por certa distinção nos gestos
e ademanes. Ninguém diria que era uma escrava, que trabalhava entre as
companheiras, e a tomaria antes por uma senhora moça, que, por
desenfado, fiava entre as escravas. Parecia a garça-real, alçando o
colo garboso e altaneiro, entre uma chusma de pássaros vulgares.
As outras escravas a contemplavam todas com certo interesse e
comiseração, porque de todas era querida, menos de Rosa, que lhe
tinha inveja e aversão mortal. Em duas palavras o leitor ficará inteirado
do motivo desta malevolência de Rosa. Não era só pura inveja; havia aí
alguma coisa de mais positivo, que convertia essa inveja em ódio mortal.
Rosa havia sido de há muito amásia de Leôncio, para quem fora fácil
conquista, que não lhe custou nem rogos nem ameaças. Desde que,
porém, inclinou-se a Isaura, Rosa ficou inteiramente abandonada e esquecida.
A gentil mulatinha sentiu-se cruelmente ferida em seu coração com esse
desdém, e como era maligna e vingativa, não podendo vingar-se de seu
senhor, jurou descarregar todo o peso de seu rancor sobre a pessoa de sua infeliz
rival.

A Escrava Isaura - Bernardo Guimarães [parte 5]

Mas forçoso lhe foi resignar-se. Não lhe faltava serviço nem acolhimento
pelas fazendas vizinhas. Conhecedores de seu mérito, os lavradores em
redor o aceitariam de braços abertos; a dificuldade estava na escolha.
Optou pelo mais vizinho, para ficar o mais perto possível de sua querida
filhinha.
Como o comendador quase sempre achava-se na corte ou em
Campos, Miguel tinha muita ocasião e facilidade de ir ver a menina, à
qual cada vez ia criando mais entranhado afeto. A esposa do comendador,
na ausência deste, dava ao português franca entrada em sua casa,
e facilitava-lhe os meios de ver e afagar a filhinha, com o que vivia ele
mui consolado e contente. De feito o céu tinha dado à sua filha na
pessoa de sua senhora uma segunda mãe tão boa e desvelada, como
poderia ser a primeira, e que mais do que esta lhe podia servir de
amparo e proteção. A morte inesperada daquela virtuosa senhora veio
despedaçar-lhe o coração, quebrando-lhe todas as suas lisonjeiras
esperanças.
Muito pode o amor paterno em uma alma nobre e sensível!...
Miguel, sobrepujando todo o ódio, repugnância e asco, que lhe inspirava a
pessoa do comendador, não hesitou em ir humilhar-se diante dele,
importuná-lo com suas súplicas, rogar-lhe com as lágrimas nos olhos, que
abrisse preço à liberdade de Isaura.

sábado, 1 de fevereiro de 2014

A Escrava Isaura - Bernardo Guimarães [parte 4]

 Este teu marido, Malvina, não passa de um miserável patife
- disse bufando de raiva.
- Que estás dizendo, Henrique?!... que te fez ele?... - perguntou
a moça, espantada com aquele rompante.
- Tenho pena de ti, minha irmã... se soubesses... que
infâmia!...
- Estás doido, Henrique!... o que há então?
- Permita Deus que nunca o saibas!... que vilania!...
- O que houve então, Henrique?... fala, explica-te por quem és,
- exclamou Malvina, pálida e ofegante no cúmulo da aflição.
- Oh! que tens?... não te aflijas assim, minha irmã, - respondeu
Henrique, já arrependido das loucas palavras que havia soltado. Tarde
compreendeu que fazia um triste e deplorável papel, servindo de
mensageiro da discórdia e da desconfiança entre dois esposos, que até ali
viviam na mais perfeita harmonia e tranquilidade. Tarde e em
vão procurou atenuar o terrível efeito de sua fatal indiscrição.
- Não te inquietes, Malvina, continuou ele procurando sorrir-se;
- teu marido é um formidável turrão, eis aí tudo; não vás pensar que
nos queremos bater em duelo.
- Não; mas vieste espumando de raiva, com os olhos em fogo, e
com um ar...

A Escrava Isaura - Bernardo Guimarães [parte 3]

- Ah! senhor Henrique! retorquiu a menina com enfado; - o
senhor não se peja de dirigir esses galanteios a uma escrava de sua
irmã? isso não lhe fica bem; há por aí tanta moça bonita, a quem o
senhor pode fazer a corte...
- Não; ainda não vi nenhuma que te iguale, Isaura, eu te juro.
Olha, Isaura; ninguém mais do que eu está nas circunstâncias de
conseguir a tua liberdade; sou capaz de obrigar Leôncio a te libertar,
porque, se me não engano, já lhe adivinhei os planos e as intenções, e
protesto-te que hei de burlá-los todos; é uma infâmia em que não posso
consentir. Além da liberdade terás tudo o que desejares, sedas, joias,
carros, escravos para te servirem, e acharás em mim um amante
extremoso, que sempre te há de querer, e nunca te trocará por quanta
moça há por esse mundo, por bonita e rica que seja, porque tu só
vales mais que todas elas juntas.
- Meu Deus! - exclamou Isaura com um ligeiro tom de mofa; -
tanta grandeza me aterra; isso faria virar-me o juízo. Nada, meu senhor;
guarde suas grandezas para quem melhor as merecer; eu por ora estou
contente com a minha sorte.
- Isaura!... para que tanta crueldade!... escuta, - disse o moço
lançando o braço ao pescoço de Isaura.
- Senhor Henrique! - gritou ela esquivando-se ao abraço, -
por quem é, deixe-me em paz!

Programação para cinemas em Joinville

PROGRAMAÇÃO ATÉ 06/02/14
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