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segunda-feira, 22 de julho de 2013

Sobre Cultura - Terry Eagleton

Citações

"O que provavelmente leva Eagleton a ignorar essa desigualdade nas relações de poder é a excessiva importância política assumida pela cultura na atualidade. Ele salienta que os problemas básicos do novo milênio– como guerra, fome e poluição ambiental – não são absolutamente culturais, o que o leva a crer que “a cultura é mais o produto da política do que a política a serva obediente da cultura” (p. 91).

"Uma das palavras mais inflacionadas dos últimos tempos, “cultura” tornou-se um conceito que pode definir as mais diferentes e até contraditórias ideias. Partindo desse pressuposto, Terry Eagleton, em A ideia de cultura, procura não só classificar os diferentes usos do conceito, mas também mostrar que, apesar de seu uso indiscriminado, cultura é uma ideia extremamente importante para a interpretação do mundo atual, sempre salientando
sua relação com a política.

Depois de uma descrição do desenvolvimento histórico da palavra,
Eagleton coloca-a em três categorias: cultura como civilidade, como identidade e como algo comercial ou pós-moderno. Ou ainda: como excelência, ethos e economia" (p. 96). 

"No geral, essas categorias correspondem a outros termos já
bem conhecidos: alta cultura (ou Cultura), cultura popular e cultura de massa. A novidade está na maneira como esses conceitos se inter-relacionam. Na verdade,  Eagleton se refere a essa relação como “guerras culturais”. Para ele, a cultura como civilidade não é apenas um assunto estético. A importância do cânone não se deve a um mérito inerente, mas porque ele é “a pedra de toque da civilidade em geral” (p. 96).

" É a arte indicando um refinamento de vida a ser alcançado pela sociedade. Esse sentido de cultura vem sendo bastante desafiado pelo de cultura como identidade. A relação entre esses dois sentidos prenuncia o conflito entre estética e antropologia, “agora não apenas uma rixa acadêmica mas um eixo geopolítico”(p. 97). 

"Não se trata aqui de diferenças relativas ao Sul e o Norte, ou a
regiões desenvolvidas e subdesenvolvidas, mas principalmente ao Ocidente e seus Outros. De modo mais geral, as diferenças entre civilização e formas mais corporativas: “nacionalismo, nativismo, política de identidade, neofascismo, fundamentalismo religioso, valores da família, tradições comunitárias, o mundo dos combatentes ecológicos e dos adeptos da New Age” (p. 97). 

"Embora essa classificação possa parecer maniqueísta, o autor lembra que a batalha travada por esses dois sentidos de cultura tornou-se agora uma questão global. Por outro lado, os princípios liberais e emancipatórios que marcam as políticas de identidade estão incluídos também na cultura como civilidade. Para Eagleton, qualquer emancipação política na época atual estará de alguma forma em dívida com o iluminismo, “não importa
o quão indignada possa estar a respeito dessa origem” (p. 98).

"A cultura pós-moderna ou cosmopolita constitui-se também como
outra ameaça à cultura como civilidade, pois as fronteiras entre a arte de minoria e seus correlatos de massa ou popular foram progressivamente perdidas. Paradoxalmente, ocorre cada vez mais uma fusão entre a alta cultura e a pós-moderna “para proporcionar o ‘dominante’ cultural das sociedades ocidentais” (p. 105)

"... o que pode ser ilustrado pelo fato de que a alta cultura é hoje extremamente moldada pelas prioridades capitalistas. Se a cultura pós-moderna é antielitista, ela também endossa valores conservadores. Tutelada pelo mercado, a sociedade pode ser tanto liberada quanto reacionária. A cultura comercial preserva portanto muitos dos valores da alta cultura, embora os despreze como elitistas. A diferença é que ela consegue embrulhar esses valores em uma atraente embalagem antielitista enquanto a alta cultura não. Eagleton salienta que a disputa entre os três conceitos de cultura
não se restringe ao conflito cosmopolita versus local, ou entre “alta” e “baixa”cultura ou ainda entre diferentes regiões geográficas, pois esses conceitos se combinam de diferentes maneiras. No mundo pós-moderno, a cultura e a vida social voltam a estar estreitamente aliadas na forma da estética da
mercadoria, da espetacularização da política e da centralidade da imagem, entre outros aspectos. Inicialmente um termo aplicado à percepção cotidiana, a estética, após haver se tornado especializada para a arte, volta assim à sua origem mundana.  Mas o principal conflito político entre Cultura e cultura é, como
discutido anteriormente, entre a civilidade ocidental e tudo aquilo com que ela se defronta, tanto em outros lugares como em seu próprio interior. A marca maior do conflito está na relação entre um falso universalismo e identidades específicas, que tendem a se afirmar tanto mais inflexivelmente quanto mais esse falso universalismo as desrespeitar. “Cada posição, assim, coloca resolutamente a outra contra a parede.” 
(p. 121) 

"O que aparentemente está faltando nessa análise é o fato de que há uma desigualdade de poder nessa relação que favorece amplamente a chamada civilidade ocidental. A questão encontra eco em outra passagem do texto, quando o autor sugere que o pluralismo liberal e o comunitarismo são imagens refletidas um do outro" (p. 182). 

"Como reação defensiva às ações predatórias do capitalismo, surge uma multidão de culturas fechadas, celebradas pela ideologia pluralista do capitalismo como uma rica diversidade de formas de vida. Como aponta Sérgio Bellei, é uma ordem política e econômica que atualmente promove a diferença como meio de manutenção de sua hegemonia. Trata-se, mais precisamente, do capitalismo “celebrando-se a si mesmo”.

" O que ocorre então é uma supervalorização do conceito. E aqui sua crítica vai principalmente para os culturalistas pós-modernos, que enxergam cultura em toda parte, a ponto de afirmarem que “tudo nos assuntos humanos é uma questão de cultura” (p. 183).

"Preocupação semelhante já havia surgido, em outra obra,
com o conceito de ideologia: “Qualquer palavra que abranja tudo perde o seu valor e degenera em um som vazio”. E se nossa natureza é moldada pela cultura desde a base, não há nada intrínseco a ela que possa se opor a uma cultura opressiva. Tendo a cultura se tornado ampla demais e restrita demais para
que seja de muita utilidade, Eagleton propõe que seja “hora de, embora reconhecendo seu significado, colocá-la de volta em seu lugar” (p. 184).

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